a vida não erra um murro nem cansa
de ampliar seu repertório de coices
tua vó obreira da assembleia de deus
com o encosto da síndrome do pânico
teu cachorro com câncer no cu e cego
tua tia cuspindo farofa todo domingo
teu vizinho fã do george israel e do kenny g
tua cidade de esgotos na língua do sol
teu professor pedindo asilo na loja de óculos
tua prima grávida da solidão no vietnã
teu primeiro amor de mãos dadas com a morte
tua cirrose sorrindo às seis horas da noite
teu país nocauteado pelo incêndio e pelo ódio
tua voz presa dentro duma garrafa de coca-cola
teu silêncio deitado na caçamba do lixo hospitalar
tua espécie embriagada de gasolina e diesel
teu futuro mancando à beira do abismo
tua mãe mordida pelos dentes da loucura
terça-feira, 22 de dezembro de 2015
azul, (tr)adução de Jorge Teillier
verei novos rostos
verei novos dias
serei esquecido
terei memórias
verei sair o sol quando o sol sair
verei cair a chuva quando chover
andarei sem assunto
de um lado a outro
aborrecerei a meio mundo
contando a mesma história
sentarei a escrever uma carta
que não me interessa enviar
ou a olhar os garotos
nos parquinhos do bairro
sempre chegarei ao mesmo poente
a olhar o mesmo rio
irei ver filmes bestas
abrirei os braços para abraçar o vazio
tomarei vinho se me oferecerem vinho
tomarei água se me oferecerem água
e me enganarei dizendo:
"virão novos rostos
virão novos dias"
---
para un pueblo fantasma (1978)
a olhar o mesmo rio
irei ver filmes bestas
abrirei os braços para abraçar o vazio
tomarei vinho se me oferecerem vinho
tomarei água se me oferecerem água
e me enganarei dizendo:
"virão novos rostos
virão novos dias"
---
para un pueblo fantasma (1978)
quinta-feira, 17 de dezembro de 2015
por exemplo, (tr)adução de canção de fernando cabrera
aquelas tardes com o rádio na calçada
aqueles dias com Marina no sol
tenho um punhado de memórias de areia
entre os dedos com areia você se vai
as tardezinhas com violetas e rosas
os limões urubuservando o galpão
estou regando o tempo com tua memória
entre os dedos com água você se vai
em um espelho com rostos velhos
havia um lugar para tuas queixas
em um caderno de capa negra
havia um ar de coisas mortas
aqueles dias com Marina no sol
tenho um punhado de memórias de areia
entre os dedos com areia você se vai
as tardezinhas com violetas e rosas
os limões urubuservando o galpão
estou regando o tempo com tua memória
entre os dedos com água você se vai
em um espelho com rostos velhos
havia um lugar para tuas queixas
em um caderno de capa negra
havia um ar de coisas mortas
O carinha escrevia tantas histórias sobre pó e puta que embarcava nelas,
como se mastigasse a carne de quinta da vida. Entre um copo e outro de
conhaque, dizia que o importante não era grana, não desejava um jabuti
nem parar nas estantes da Biblioteca Nacional. Costumava repetir aos
quatro ventos seu sonho fabricado como um poema nas horas de tédio e
calor: voar alto num helicóptero com Aécio Neves, bebendo uísque,
convidado para contar suas mentiras cheias de esparadrapo numa festinha
particular, comemorando a volta de Bruna Surfistinha ao trabalho.
David Meza trouxe cerveja
Também nunca vi as pirâmides do Egito. Minha vida sacoleja como um velho
cometa pelo céu da boca. Meu pai trabalhava como taxista dia e noite,
ganhava pouco. Os pais de meus amigos ganhavam ainda menos. Eu não
escrevi um poema fuderoso entre as ruas de Berlim. Os devaneios são as
últimas moedas que nos deixaram ou, melhor dizendo, não conseguiram
roubar de nossas vísceras. Não me inspirou o canto nenhuma praia perdida
e misteriosa. Eu não vi o mundo desde o
alto das montanhas do Himalaia, mas vi o mundo desde o poema. Escrevo
em companhia dos que atravessaram o rio do sonho para encontrarem-se com
a morte, dos que disseram "o pão nosso de cada dia nos dai hoje" e não
foram escutados, dos que perambulam pelo mundo com os pés ensanguentados
e um par de sapatos nas mãos. Escrevo em companhia deles, que não
dormiram nos jardins do Taj Mahal. Escrevo em companhia deles, para os
quais o Coliseu segue sendo uma mostra de aflição e crueldade. E agora
lhes digo: suas orelhas são mais fascinantes que qualquer templo grego,
há mais encanto em um só de seus soluços que em todas as ruas de Paris.
Em companhia deles, conservei um pouco da minha vida, e da minha morte,
neste poema. Em companhia deles, também digo: também nunca vi as
pirâmides do Egito, mas junto de mim os pássaros criaram uma habitação
maravilhosa.
quinta-feira, 26 de novembro de 2015
quarta-feira, 4 de novembro de 2015
sexta-feira, 23 de outubro de 2015
esse aí não diz coisa com coisa e vive
de mãos dadas com o silêncio dizendo
que o vento está visivelmente cansado
esse aí não diz coisa com coisa e uiva
e canta e dança e dá um nó na pança
depois joga xadrez sozinho na sarjeta
esse aí não diz coisa com coisa e vaza
entre carros, motos e corujas de plástico
antes que a polícia pule no seu pescoço
esse aí não diz coisa com coisa e vigia
os pombos comendo pipoca no asfalto
e os ratos lhe trazem um pouco de queijo
esse aí não diz coisa com coisa e visita
todas as árvores que restam na cidade
e carrega muitas folhas debaixo da língua
esse aí não diz coisa com coisa e vai
feito um vulto que valsa nas praças
no meio dos que não estão descalços
esse aí não diz coisa com coisa e vê
formigas de ferro bem no cocuruto
dos que se apressam e passam
esse aí não diz coisa com coisa e vadio
trabalha na alucinação das carnes
e consegue ser feliz ao meio-dia
de mãos dadas com o silêncio dizendo
que o vento está visivelmente cansado
esse aí não diz coisa com coisa e uiva
e canta e dança e dá um nó na pança
depois joga xadrez sozinho na sarjeta
esse aí não diz coisa com coisa e vaza
entre carros, motos e corujas de plástico
antes que a polícia pule no seu pescoço
esse aí não diz coisa com coisa e vigia
os pombos comendo pipoca no asfalto
e os ratos lhe trazem um pouco de queijo
esse aí não diz coisa com coisa e visita
todas as árvores que restam na cidade
e carrega muitas folhas debaixo da língua
esse aí não diz coisa com coisa e vai
feito um vulto que valsa nas praças
no meio dos que não estão descalços
esse aí não diz coisa com coisa e vê
formigas de ferro bem no cocuruto
dos que se apressam e passam
esse aí não diz coisa com coisa e vadio
trabalha na alucinação das carnes
e consegue ser feliz ao meio-dia
charles manson telefona todos os meses
para me dizer que o ar é deus e fumaça
é tudo que irriga os ossos do crânio
é triste que donas de casa tomem valium
e desconheçam os benefícios do lsd
contra a depressão e o tédio, fantasmas
procurando vídeos pornôs nas pupilas
de uma testemunha de jeová, fantasmas
procriando no abismo da pele, fantasmas
sampleando a tristeza de guaxinins
enfiados em gaiolas e expostos nas pontes
das cidades sufocadas no alumínio publicitário
um açougueiro dormindo em cima de uma tartaruga
ninho de parasitas no peito da promessa militar
sou um criminoso tirando cochilo, diz
sou um cafetão incompetente, diz
sou um obtuso ladrão de carros, diz
um gatuno de mão pesada que só busca
algo para fumar, uma guitarra
um bom lugar para cagar e vinagre
de maçã para os fungos nos pés
para me dizer que o ar é deus e fumaça
é tudo que irriga os ossos do crânio
é triste que donas de casa tomem valium
e desconheçam os benefícios do lsd
contra a depressão e o tédio, fantasmas
procurando vídeos pornôs nas pupilas
de uma testemunha de jeová, fantasmas
procriando no abismo da pele, fantasmas
sampleando a tristeza de guaxinins
enfiados em gaiolas e expostos nas pontes
das cidades sufocadas no alumínio publicitário
um açougueiro dormindo em cima de uma tartaruga
ninho de parasitas no peito da promessa militar
sou um criminoso tirando cochilo, diz
sou um cafetão incompetente, diz
sou um obtuso ladrão de carros, diz
um gatuno de mão pesada que só busca
algo para fumar, uma guitarra
um bom lugar para cagar e vinagre
de maçã para os fungos nos pés
letargia, lenta argila na goela
um gorila na orelha, caco de telha
tudo que ela encontra, escombro
sombra-sirene, sereia séria
ao escarificar toda proeza
uma prosa-prozac
kojak chorando em cima da mesa
gyodai comendo goiaba
enquanto espera os papéis
na varanda da alfândega
da guiana francesa
e o conde do brega
assando um bagre
na brasa e alegre
coçando a barriga
um gorila na orelha, caco de telha
tudo que ela encontra, escombro
sombra-sirene, sereia séria
ao escarificar toda proeza
uma prosa-prozac
kojak chorando em cima da mesa
gyodai comendo goiaba
enquanto espera os papéis
na varanda da alfândega
da guiana francesa
e o conde do brega
assando um bagre
na brasa e alegre
coçando a barriga
quarta-feira, 30 de setembro de 2015
ah, saudade punk que eu tenho
de ficar jogando videogame
num velho super nintendo
olho no vidro de cada frame
ou então depois de passar
na padaria ir para o playtime
colocar o troco do pão
em cada máquina arcade
pobre de mim, pobre de mim
que já não carrego vacas
com o earthworm jim
os emuladores já não trazem mais
a infância dos golpes e saltos
os sustos e os sopapos dos macacos
e das minhocas, nem as horas mortas
para as quais não há continue, isso foi
e eu já fui
de ficar jogando videogame
num velho super nintendo
olho no vidro de cada frame
ou então depois de passar
na padaria ir para o playtime
colocar o troco do pão
em cada máquina arcade
pobre de mim, pobre de mim
que já não carrego vacas
com o earthworm jim
os emuladores já não trazem mais
a infância dos golpes e saltos
os sustos e os sopapos dos macacos
e das minhocas, nem as horas mortas
para as quais não há continue, isso foi
e eu já fui
quinta-feira, 24 de setembro de 2015
o universo em expansão em cada
pequenino grão de mostarda
e tantas dores e delírios
ardendo feito vinagre
derramado na carne aberta
de todos os seres e pedras
e eu aqui todo besta e alegre
com febre e imitando
o sotaque de adoniran repetindo
infinitas vezes, aracy balabanian
aracy balabanian, aracy balabanian
pequenino grão de mostarda
e tantas dores e delírios
ardendo feito vinagre
derramado na carne aberta
de todos os seres e pedras
e eu aqui todo besta e alegre
com febre e imitando
o sotaque de adoniran repetindo
infinitas vezes, aracy balabanian
aracy balabanian, aracy balabanian
caminho-carniça, ninho de ratos
nos pratos sujos do peito
você disse a morte anda descalça
você disse o morto anda de skate
uma noite de barbitúricos
& sinucas em massachusetts
três copos de rum, uma garrafa
de rum & as vozes de seda
do absinto, o absurdo doméstico
dentro do estômago dos dromedários
qualquer língua sobre veludo verde,
martelo & prego
as piadas do sangue seco no chão,
o sol-vidro-moído das manhãs
aqueles litros de café na casa de praia do osama
bin laden junto com adam sandler
nos pratos sujos do peito
você disse a morte anda descalça
você disse o morto anda de skate
uma noite de barbitúricos
& sinucas em massachusetts
três copos de rum, uma garrafa
de rum & as vozes de seda
do absinto, o absurdo doméstico
dentro do estômago dos dromedários
qualquer língua sobre veludo verde,
martelo & prego
as piadas do sangue seco no chão,
o sol-vidro-moído das manhãs
aqueles litros de café na casa de praia do osama
bin laden junto com adam sandler
dor das loterias. arrume um mergulho,
sinta orgulho de nadar e de todos os lugares
o que penso en el cine o en la relación amorosa del viento
y las guías de viaje que hojeas con barrigas preñadas de muerte.
la esperanza de ter escrito e poeta do trem.
Uma vez foi definido que a poesia da nossa sociedade
é pensamento é denso espessa nuvem de incenso
povoando a chance dos cemitérios cujas árvores
implantam filamentos verdes desalinhados reis
celebram a púrpura e comandam trompetistas auricolores
até a baleia pede mais beleza, mais beleza.
sinta orgulho de nadar e de todos os lugares
o que penso en el cine o en la relación amorosa del viento
y las guías de viaje que hojeas con barrigas preñadas de muerte.
la esperanza de ter escrito e poeta do trem.
Uma vez foi definido que a poesia da nossa sociedade
é pensamento é denso espessa nuvem de incenso
povoando a chance dos cemitérios cujas árvores
implantam filamentos verdes desalinhados reis
celebram a púrpura e comandam trompetistas auricolores
até a baleia pede mais beleza, mais beleza.
thomas more ouvia faith no more
& você nunca foi a maranguape
quando nanico me assustei
com um vesgo vendedor
de picolés e até hoje
peço desculpas
jamais perdi as bolas de gude
que jogava naquele dia
assim como não perdi a fome
de me embrenhar no breu
hoje consigo encontrar pássaros
verdes no meio das folhas verdes
verões na memória cheia de água
as lágrimas são amigas deitadas
em colheres repletas de wasabi
& o vento nos traz vozes de alcatraz
onde garis dormem nas madrugadas
& você nunca foi a maranguape
quando nanico me assustei
com um vesgo vendedor
de picolés e até hoje
peço desculpas
jamais perdi as bolas de gude
que jogava naquele dia
assim como não perdi a fome
de me embrenhar no breu
hoje consigo encontrar pássaros
verdes no meio das folhas verdes
verões na memória cheia de água
as lágrimas são amigas deitadas
em colheres repletas de wasabi
& o vento nos traz vozes de alcatraz
onde garis dormem nas madrugadas
pau de arara de selfie
chacrinha & sua buzina
me contaram: na esquina
tem duas casas de chá
chacrinha & sua buzina
me contaram: na esquina
tem duas casas de chá
& os poetas bebem
erva doce, capim santo
& ouvem o canto
de um abutre colorido
enquanto no porão cozinham
o gemido, o urro, o berro & um caldo
misturado de lama, anis & estricnina
para fixar na carne um arame, um aroma
azedo & deitar na calçada um corpo em coma
depois de mais uma sessão de fotografias
erva doce, capim santo
& ouvem o canto
de um abutre colorido
enquanto no porão cozinham
o gemido, o urro, o berro & um caldo
misturado de lama, anis & estricnina
para fixar na carne um arame, um aroma
azedo & deitar na calçada um corpo em coma
depois de mais uma sessão de fotografias
aquele misto de euforia & eutanásia
dirigir nu até acabar a gasolina
numa carona para texugos cegos
eu faria um forró no pátio da nasa
uma casa no olho fundo da turmalina
Big Kahuna trouxe um chapéu de pregos
dirigir nu até acabar a gasolina
numa carona para texugos cegos
eu faria um forró no pátio da nasa
uma casa no olho fundo da turmalina
Big Kahuna trouxe um chapéu de pregos
acendi um cigarro para slavka, vodka
eu derrubei em cima da cama, comi
uma panqueca de caco de vidro
esqueci o nome do vento
uma anta no bolso do esquimó
florestas de eucalipto na língua do eunuco
sequelas & sequoias penduradas no pescoço
pés descalços no aço frio do chão de outro UFO
eu derrubei em cima da cama, comi
uma panqueca de caco de vidro
esqueci o nome do vento
uma anta no bolso do esquimó
florestas de eucalipto na língua do eunuco
sequelas & sequoias penduradas no pescoço
pés descalços no aço frio do chão de outro UFO
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
carisma ou arranjo de fenômeno repaginado
coragem sem fundo, sonhei você de bobeira
como folha depois a alegria, saudade, coração
fica maluco, outra vez vou te buscar, beber até o dia
clarear, eu tô aqui e hoje tinha sacanagem
esqueço dos meus problemas, desse jeito é perigoso,
só chego de manhã, o vento leva passando de fininho,
o baile de repente chega, bebi tequila, bebi tequila.
longe mas sonha, esse papo ter de volta minha cabeça,
barriga cheia, sem chão
outra pessoa deu um fora, a festa começa
só amanhã.
como folha depois a alegria, saudade, coração
fica maluco, outra vez vou te buscar, beber até o dia
clarear, eu tô aqui e hoje tinha sacanagem
esqueço dos meus problemas, desse jeito é perigoso,
só chego de manhã, o vento leva passando de fininho,
o baile de repente chega, bebi tequila, bebi tequila.
longe mas sonha, esse papo ter de volta minha cabeça,
barriga cheia, sem chão
outra pessoa deu um fora, a festa começa
só amanhã.
domingo, 5 de julho de 2015
falar é uma deliciosa loucura
e a comida começa
no pensamento
o som que enche a palavra
vento é o próprio vento
espírito
o sopro cria acontecimentos, carne
divina & dançante na sabedoria
espontânea do corpo mamífero
e não há tristeza caolha filha do coice
da mente que derrame cianureto suficiente
para calar o batismo do batuque dos ossos
e a comida começa
no pensamento
o som que enche a palavra
vento é o próprio vento
espírito
o sopro cria acontecimentos, carne
divina & dançante na sabedoria
espontânea do corpo mamífero
e não há tristeza caolha filha do coice
da mente que derrame cianureto suficiente
para calar o batismo do batuque dos ossos
e subi no ônibus e sentei do lado de uma senhora ruiva, uns 60 anos.
sem tempo nem de guardar as moedas do troco no bolso, ela disparou pra
mim:
- político é tudo ladrão! e essa dilma é a pior. no meu tempo as ruas eram seguras e nossa dinheiro valia muito mais. o governo agora fica com tudo que produzimos. é imposto em cima de imposto e grrr e argh e blá e uuuuuuu ...
e foi metralhando seu texto até que disse:
- ninguém aguenta mais tanto tributo!
meio tonto, só consegui dizer:
- porra, bote fé! eu mesmo só gosto do tributo ao black sabbath!
e gargalhei feito doido, me levantei, aproveitei que alguém havia pedido parada, desci. fora do ônibus pude notar a senhora lançando seu olhar "é o fim dos tempos" pra mim, que continuava gargalhando com a própria piada ruim.
- político é tudo ladrão! e essa dilma é a pior. no meu tempo as ruas eram seguras e nossa dinheiro valia muito mais. o governo agora fica com tudo que produzimos. é imposto em cima de imposto e grrr e argh e blá e uuuuuuu ...
e foi metralhando seu texto até que disse:
- ninguém aguenta mais tanto tributo!
meio tonto, só consegui dizer:
- porra, bote fé! eu mesmo só gosto do tributo ao black sabbath!
e gargalhei feito doido, me levantei, aproveitei que alguém havia pedido parada, desci. fora do ônibus pude notar a senhora lançando seu olhar "é o fim dos tempos" pra mim, que continuava gargalhando com a própria piada ruim.
você descascando limão debaixo do sorriso da lua,
o aprendizado contínuo da lentidão, a barriga imensa
das noites tristes, um pedaço de fígado pendurado
nos dentes de vidro da estátua verde do big kahuna
você acenando para discos voadores, aparando a barba
da mansidão banguela, a voz do ventríloquo pedindo
um pouco de tequila, duas clavículas encharcadas
de lágrimas e milagres, o sol velhinho na hidroginástica
você mascando tabaco, macerando as folhas de manjericão,
o encontro dos sapatos com as tartarugas num jogo de pôquer,
as dúvidas tirando um cochilo na calçada, pernas batendo papo
com o vento feiticeiro e meus ossos repetindo o mantra:
wakin in the dawn of day, don't know why i ever go away.
o aprendizado contínuo da lentidão, a barriga imensa
das noites tristes, um pedaço de fígado pendurado
nos dentes de vidro da estátua verde do big kahuna
você acenando para discos voadores, aparando a barba
da mansidão banguela, a voz do ventríloquo pedindo
um pouco de tequila, duas clavículas encharcadas
de lágrimas e milagres, o sol velhinho na hidroginástica
você mascando tabaco, macerando as folhas de manjericão,
o encontro dos sapatos com as tartarugas num jogo de pôquer,
as dúvidas tirando um cochilo na calçada, pernas batendo papo
com o vento feiticeiro e meus ossos repetindo o mantra:
wakin in the dawn of day, don't know why i ever go away.
sexta-feira, 19 de junho de 2015
poema de chico xavier
pois eu estava mergulhada
no estômago de animais
que nos mastigaram
bocas sujas, planeta azul
das trevas, as dúvidas, espíritos
rebeldes, filmes de horror que assisti.
memória, labirinto hipnótico.
memória, minotauro-tuareg.
memória, lábia do olho cego.
insetos e anfíbios: tudo fica
registrado num diário, num delírio.
milhares de outros seres
despertos com música, sementes
depositadas na roda-gigante.
lesões, comunidade.
___________________________
- texto escrito a partir de arranjos
da suposta carta psicografada de cássia eller
ouro dentro da escuridão
se a gente morre por aqui
não encontrarão nem a alma
as palavras perdem seu peso
na figura do aviador
e a bicicleta ultrapassa
o milagre, vacas diminutas
de olhares sonolentos
e foi só por isso que vieram matar
e foi só por isso que disseram no meio do mato
se algo estiver escondido lá na sujeira do coração
e você o desenterrar, é seu também, é você.
se a gente morre por aqui
não encontrarão nem a alma
as palavras perdem seu peso
na figura do aviador
e a bicicleta ultrapassa
o milagre, vacas diminutas
de olhares sonolentos
e foi só por isso que vieram matar
e foi só por isso que disseram no meio do mato
se algo estiver escondido lá na sujeira do coração
e você o desenterrar, é seu também, é você.
caos-pizzaria, você disse alimentando
os peixes que se multiplicavam
debaixo das barbas das profetas
indianas fãs de heavy metal & loucas
por noites de apneia & levitação
os peixes que se multiplicavam
debaixo das barbas das profetas
indianas fãs de heavy metal & loucas
por noites de apneia & levitação
eu cuidava de fazer vitaminas
de abacates para cobrir a ferrugem
da coleção de alicates de vovô & derramar
doses cavalares de conhaque nos cactos,
nos cascos dos jabutis, nas costas
de nossa irmã anã massoterapeuta
vovó descascava manga com sua katana
iluminada pelo lado escuro da lua & nua
cuspia pregos nos sapatos coloridos
& enormes de seu amante cego
de abacates para cobrir a ferrugem
da coleção de alicates de vovô & derramar
doses cavalares de conhaque nos cactos,
nos cascos dos jabutis, nas costas
de nossa irmã anã massoterapeuta
vovó descascava manga com sua katana
iluminada pelo lado escuro da lua & nua
cuspia pregos nos sapatos coloridos
& enormes de seu amante cego
sexta-feira, 8 de maio de 2015
segunda-feira, 27 de abril de 2015
tom zé do caixão
você, vocêê, todos vocêêês,
filhos da máquina, na entranha
gasolina e outras almas roubadas
na meia-noite de uma multinacional
filhos da máquina, na entranha
gasolina e outras almas roubadas
na meia-noite de uma multinacional
jorge de lima da pérsia
a lua vem da ásia, gigante
panfletário do caos e você
me traz carregamentos de
laranjas sanguíneas. a sede
começa no cheiro da casca
que se espalha e impregna
meus dias, meus dedos e
a cachaça, minha carcaça.
panfletário do caos e você
me traz carregamentos de
laranjas sanguíneas. a sede
começa no cheiro da casca
que se espalha e impregna
meus dias, meus dedos e
a cachaça, minha carcaça.
o sol pesando nos ombros e eu já tinha tomado uns quatro copos de
cerveja que murilo trouxe, uma cerva artesanal chamada "samurai cego".
falei pra ele que a primeira coisa que me vinha a mente com esse lance
de samurai era que eu não passava dois minutos jogando samurai shodown
no playtime aqui perto de casa que aparecia um prego qualquer pra
colocar contra e me tirar da máquina, com algumas malícias de galford,
hanzo ou haohmaru. eu não sabia jogar muita coisa com nenhum deles
e gostava do naipe do kyoshiro - lembrando dessa conversa dias depois
eu notei pela primeira vez que o kyoshiro é um ator de kabuki. daí eu
partia pra o arcade de real bout fatal fury e lá ninguém me incomodava,
quem colocava contra zarpava por conta do taekwondo que aprendi com kim
kaphwan. murilo, cortando a lombra, disse que está tudo integrado: o
gari japonês que vive com uma real doll é primo da menina que se
fantasia de sereia no interior de minas gerais. Eu ri com a associação. a
memória é sempre uma chuva inesperada, tudo é pólvora e fogo, gatilho.
murilo perguntou se eu já tinha lido proust. eu disse que não tinha lido
nem o prost e não gostava do joguinho de super nitendo do nigel
mansell. a idiotice é uma fruta muito doce. proust é um cara que
escreveu sobre como o biscoito treloso nos faz lembrar os dias de surf
em 1990, disparou murilo. fiquei sem saber o que responder e nessa hora
caíram duas mangas no quintal, foi jah. comendo as mangas, acho que
entendi a ideia do biscoito treloso. lembrei que dia desses tava tocando
just like the wind, do tony garcia, na carrocinha do tio que vende
caldo de cana e pão doce aqui na esquina. de repente, sem mais nem
menos, eu era novamente um pirralho dançando como um robô desajeitado
nas noites de rádio na varanda do térreo do prédio de alessandro
pacovan, a rua logo ali. daí bateu saudade de entrar na fila da merenda
da escola várias vezes, torcendo o rosto pra um lado e outro, pra baixo,
mancando e feito o seu boneco "dis costa" para catar uns quatro ou
cinco saquinhos de cilpinho de chocolate com pão doce.
sábado, 11 de abril de 2015
dizemos água e continuamos
com sede, o banho de chuva
ácida não lava nossa alma
mas expõe todos os ossos
há um enigma cabisbaixo
surfando em nossas lágrimas
há um milagre moribundo
impregnando nosso suor
nossas salivas não salvam
os oceanos de merda e plástico
tartarugas morrem todos os dias
sufocadas no horror de nosso sangue
não há líquido amniótico suficiente
para proteger os nascimentos dos rios
e não adianta andar sobre as águas
ou então transformá-las em vinho
enquanto não renovamos a seiva
de nossa medula mergulhando
plenamente na lama e no lodo, diluindo
nosso egos nas águas subterrâneas
dizemos água e continuamos
uns animais cheios de esquiva
esquecendo nossa origem aquática
e uma ética molhada para estes dias
com sede, o banho de chuva
ácida não lava nossa alma
mas expõe todos os ossos
há um enigma cabisbaixo
surfando em nossas lágrimas
há um milagre moribundo
impregnando nosso suor
nossas salivas não salvam
os oceanos de merda e plástico
tartarugas morrem todos os dias
sufocadas no horror de nosso sangue
não há líquido amniótico suficiente
para proteger os nascimentos dos rios
e não adianta andar sobre as águas
ou então transformá-las em vinho
enquanto não renovamos a seiva
de nossa medula mergulhando
plenamente na lama e no lodo, diluindo
nosso egos nas águas subterrâneas
dizemos água e continuamos
uns animais cheios de esquiva
esquecendo nossa origem aquática
e uma ética molhada para estes dias
o menino jesus queria
ser bombeiro, disse
terezinha maria de jesus,
mãe do menino jesus.
foi baleado na porta de casa,
o menino eduardo de jesus ferreira,
lá no complexo do alemão.
foi a polícia: "houve um confronto
e um menor foi baleado".
fomos nós mesmos que crucificamos o menino jesus
bem antes dos trinta e três anos.
na tv, segue o feriadão da semana santa.
uns comem peixe, outros tomam cerveja.
e o menino jesus não voltará como bombeiro
para nos salvar deste incêndio.
ser bombeiro, disse
terezinha maria de jesus,
mãe do menino jesus.
foi baleado na porta de casa,
o menino eduardo de jesus ferreira,
lá no complexo do alemão.
foi a polícia: "houve um confronto
e um menor foi baleado".
fomos nós mesmos que crucificamos o menino jesus
bem antes dos trinta e três anos.
na tv, segue o feriadão da semana santa.
uns comem peixe, outros tomam cerveja.
e o menino jesus não voltará como bombeiro
para nos salvar deste incêndio.
segunda-feira, 23 de março de 2015
ele não tem dúvidas de que é o maior poeta brasileiro vivo. mas anda
mesmo é com a cabeça nas enterradas do kobe bryant e quase chora quando
as luzes da quadra de basquete de rua do interior de buenos aires, no
interior de pernambuco, estão acesas à noite. isto acontece uma vez ao
mês. o pai trabalha na feira da cidade, a mãe faz artesanato que um
gringo atravessador compra barato e vende caro em berlim. dois metros e
vinte centímetros. ele não duvida que é o maior poeta brasileiro vivo. e
vive lembrando que poesia não salva ninguém, anda sempre de barro. e
não desenrola nem uma bola, nem as luzes acesas durante o mês. mas ele
continua escrevendo e tentando arremessos de três e ménage à trois.
verde é a cor do mofo e da corrupção.
deslizamos suavemente sobre
a superfície das águas
sem saber
que os motores do barco
irão parar de repente
e ficaremos
à deriva
por pouco tempo, é verdade.
peste, guerra, fome e morte
são cavalos rápidos
e estamos espalhando nosso necrochorume
pelos lençóis freáticos.
freaks fanáticos, aprendemos a gozar
entre os gases do efeito estufa
e os vapores do asfalto.
osso contra osso, ácido.
os mortos enterram os mortos
e as baratas e os javalis não sentirão nossa falta.
já não há fantasmas no sofá,
e do vinho não sobrou nem os copos
e eu não ouço mais minha vó cantar:
o planeta é uma planta y no plata.
deslizamos suavemente sobre
a superfície das águas
sem saber
que os motores do barco
irão parar de repente
e ficaremos
à deriva
por pouco tempo, é verdade.
peste, guerra, fome e morte
são cavalos rápidos
e estamos espalhando nosso necrochorume
pelos lençóis freáticos.
freaks fanáticos, aprendemos a gozar
entre os gases do efeito estufa
e os vapores do asfalto.
osso contra osso, ácido.
os mortos enterram os mortos
e as baratas e os javalis não sentirão nossa falta.
já não há fantasmas no sofá,
e do vinho não sobrou nem os copos
e eu não ouço mais minha vó cantar:
o planeta é uma planta y no plata.
afinal de contas, ser feliz pra quê? ela perguntou como quem atira um
vaso chinês da dinastia ming contra a parede. eu olhava cada caquinho de
porcelana, com suas pequenas flores azuis desfiguradas. a vida é o que
é, um pouco de vento alivia a tristeza das samambaias, um pouco de água
sempre é suficiente para fazer o filhote de leopardo que guardo no peito
abrir um sorriso. as pequenas flores azuis, os caquinhos, começaram a
se juntar quando uma ambulância passou na avenida rasgando
o horizonte para socorrer corações atropelados. esqueci de dizer,
estávamos pelados. as palavras caem no chão feito frutas. às vezes é
possível encontrar uma manga madura no chão, sem grandes hematomas. mas
na maior parte do tempo chegamos atrasados e as palavras apodrecem.
frases ditas perto da caixa toráxica pesam mais que a respiração dos
rinocerontes. em tudo que disse, ela permaneceu de olhos fechados.
lindos olhos verdes dormindo debaixo das pálpebras do sonambulismo. como
um geógrafo cego, tateei o dorso dela, as pernas, os poemas das
omoplatas, as canções das orelhas e a tranquilidade dos dedos mindinhos
dos pés. a imagem da felicidade é um guarda-chuva que esquecemos no
ônibus que nos levou para longe de nós mesmos. ela abriu os olhos. eu já
não precisava descobrir a tradução do termo sânscrito santosha.
cometeremos erros melhores amanhã, eu disse.
o oceano é uma
cama larga: esta
canção é sobre
sangue sobre
tempo também
nossos corpos
à deriva
vinho e cerveja,
estamos mortos
e jamais morreremos
os ossos dos nossos
dedos batucam a pele
das águas no ritmo
destas gotas de chuva
uma delícia, este vinho
uma delícia, esta cerveja
nossos corpos
à deriva
tiamat nos festeja
cama larga: esta
canção é sobre
sangue sobre
tempo também
nossos corpos
à deriva
vinho e cerveja,
estamos mortos
e jamais morreremos
os ossos dos nossos
dedos batucam a pele
das águas no ritmo
destas gotas de chuva
uma delícia, este vinho
uma delícia, esta cerveja
nossos corpos
à deriva
tiamat nos festeja
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015
o tigre e william blake o golfinho
e dora ferreira da silva o urubu
e augusto dos anjos o corvo
e edgar allan poe o albatroz
e charles baudelaire a barata
e clarice lispector a lesma
e manoel de barros a abelha
e alice ruiz o sapo
e manuel bandeira o sapo liu-liu
e hilda hilst a rã
e matsuo bashô o cão
e alberto da cunha melo o cão
e joão cabral de melo neto o peixe
e adília lopes o cisne
e william butler yeats o pássaro
e alejandra pizarnik o pássaro
e charles bukowski o jaguar
e roberto piva o lobo
e virginia woolf o escorpião
e bruna surfistinha o puma
e hannah höch o urso
e cassiano ricardo o urso
e diane di prima o unicórnio
e audre lorde o leão
e michael mcclure o leão
e björk o gato
e maya deren o cavalo
e patti smith
e dora ferreira da silva o urubu
e augusto dos anjos o corvo
e edgar allan poe o albatroz
e charles baudelaire a barata
e clarice lispector a lesma
e manoel de barros a abelha
e alice ruiz o sapo
e manuel bandeira o sapo liu-liu
e hilda hilst a rã
e matsuo bashô o cão
e alberto da cunha melo o cão
e joão cabral de melo neto o peixe
e adília lopes o cisne
e william butler yeats o pássaro
e alejandra pizarnik o pássaro
e charles bukowski o jaguar
e roberto piva o lobo
e virginia woolf o escorpião
e bruna surfistinha o puma
e hannah höch o urso
e cassiano ricardo o urso
e diane di prima o unicórnio
e audre lorde o leão
e michael mcclure o leão
e björk o gato
e maya deren o cavalo
e patti smith
o oceano é uma
cama larga: esta
canção é sobre
sangue sobre
tempo também
nossos corpos
à deriva
vinho e cerveja,
estamos mortos
e jamais morreremos
os ossos dos nossos
dedos batucam a pele
das águas no ritmo
destas gotas de chuva
uma delícia, este vinho
uma delícia, esta cerveja
nossos corpos
à deriva
tiamat nos festeja
cama larga: esta
canção é sobre
sangue sobre
tempo também
nossos corpos
à deriva
vinho e cerveja,
estamos mortos
e jamais morreremos
os ossos dos nossos
dedos batucam a pele
das águas no ritmo
destas gotas de chuva
uma delícia, este vinho
uma delícia, esta cerveja
nossos corpos
à deriva
tiamat nos festeja
nos bolsos furados da nossa memória:
as pernas quebradas, um velhinho jogando
pôquer com os pombos, um pedaço de chão
coberto de lodo onde enfiamos nosso narizes
para fugir do cheiro do barulho dos prédios,
moscas sobrevoando a paz dos pratos sujos,
livros de receitas da avó de eddie vedder,
bagas, litros de suco de pitanga com pastel,
plantas carnívoras, carcaças de canários,
gols feitos durante a fuga das aulas de língua
portuguesa, noites de vinho & vômito, visões
de naves alienígenas transformadas em bolhas
de sabão, sabedoria da velhinha que vendia
amendoins e deliciosos caldinhos de sururu,
o peixe-beta que morreu na frente do espelho,
as bolas de gude roubadas e perdidas, mangas
com sal nos terrenos baldios, deus e sua solidão.
pôquer com os pombos, um pedaço de chão
coberto de lodo onde enfiamos nosso narizes
para fugir do cheiro do barulho dos prédios,
moscas sobrevoando a paz dos pratos sujos,
livros de receitas da avó de eddie vedder,
bagas, litros de suco de pitanga com pastel,
plantas carnívoras, carcaças de canários,
gols feitos durante a fuga das aulas de língua
portuguesa, noites de vinho & vômito, visões
de naves alienígenas transformadas em bolhas
de sabão, sabedoria da velhinha que vendia
amendoins e deliciosos caldinhos de sururu,
o peixe-beta que morreu na frente do espelho,
as bolas de gude roubadas e perdidas, mangas
com sal nos terrenos baldios, deus e sua solidão.
sexta-feira, 30 de janeiro de 2015
você recebe o poema pelas pernas
e então corre feito uma criança
picada por vespas amarelas
você recebe o poema pelas unhas
e então descasca as camadas
antigas de tinta sobre as pupilas
você recebe o poema pelas pálpebras,
pelas nádegas, pelas sobrancelhas,
pelas narinas, pelas virilhas, medula
você recebe o poema pela testa,
mandíbulas, o poema fura tuas bochechas,
faz tremer as tuas coxas (como numa foda)
você recebe o poema e ele quebra tuas costelas
e coloca na tua garganta as vozes das capivaras
que não escaparam de nossa sede de sangue & carne
você recebe o poema: purple haze, bike, avatar:
o poema abre tua boca, o poema deita em tua língua.
e então corre feito uma criança
picada por vespas amarelas
você recebe o poema pelas unhas
e então descasca as camadas
antigas de tinta sobre as pupilas
você recebe o poema pelas pálpebras,
pelas nádegas, pelas sobrancelhas,
pelas narinas, pelas virilhas, medula
você recebe o poema pela testa,
mandíbulas, o poema fura tuas bochechas,
faz tremer as tuas coxas (como numa foda)
você recebe o poema e ele quebra tuas costelas
e coloca na tua garganta as vozes das capivaras
que não escaparam de nossa sede de sangue & carne
você recebe o poema: purple haze, bike, avatar:
o poema abre tua boca, o poema deita em tua língua.
segunda-feira, 26 de janeiro de 2015
os méritos do cinismo
ridiculamente tímidos e prudentes, isto que somos.
quando aprenderemos novamente a cuspir
nos rostos dos proprietários da terra?
há uma virtude restauradora nos oceanos de saliva,
uma graça infinita na aventura enlouquecida da sinceridade.
contra a hipnose do infinito, contra os freios da hipocrisia
contra os bocejos da sabedoria de palestra.
escolhemos desfilar nossa solidão em praça pública,
desafiamos a claridade barriguda dos militares.
quem escuta as respostas do lodo para questões místicas?
quem escuta nossa zombaria e latidos enquanto compra
cervejas quentes feitas de milho transgênico por bolivianos cansados?
a tarefa do poeta é bater punheta para gozar na cara
dos doutrinadores da alma & do corpo, exibir
a completa amargura e lavar os ossos
de nossa condição despojada.
"quem me dera que bastasse também
esfregar a barriga para não ter mais fome",
disse o cão celestial depois de ejacular.
condomínio de enfermos, prisioneiros da certeza,
haverá uma chuva de equívocos e sairemos bêbados
carregados pelos pontapés do nojo que o tempo nutre
de nossa miséria, nossa farsa: um rosto repugnante
que insistimos em transformar em senhor das moscas.
quando aprenderemos novamente a cuspir
nos rostos dos proprietários da terra?
há uma virtude restauradora nos oceanos de saliva,
uma graça infinita na aventura enlouquecida da sinceridade.
contra a hipnose do infinito, contra os freios da hipocrisia
contra os bocejos da sabedoria de palestra.
escolhemos desfilar nossa solidão em praça pública,
desafiamos a claridade barriguda dos militares.
quem escuta as respostas do lodo para questões místicas?
quem escuta nossa zombaria e latidos enquanto compra
cervejas quentes feitas de milho transgênico por bolivianos cansados?
a tarefa do poeta é bater punheta para gozar na cara
dos doutrinadores da alma & do corpo, exibir
a completa amargura e lavar os ossos
de nossa condição despojada.
"quem me dera que bastasse também
esfregar a barriga para não ter mais fome",
disse o cão celestial depois de ejacular.
condomínio de enfermos, prisioneiros da certeza,
haverá uma chuva de equívocos e sairemos bêbados
carregados pelos pontapés do nojo que o tempo nutre
de nossa miséria, nossa farsa: um rosto repugnante
que insistimos em transformar em senhor das moscas.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu estaria parado na frente de um rinoceronte
fumando um fininho californiano encontrado
entre sapatos abandonados e hare krishnas.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu estaria o dia inteiro enfiando álcool e gasolina
nos tanques de combustível dos carros currados
por motoristas sem imaginação, depois do polimento.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu ainda estaria trabalhando na televisão
ligando para delegacias à procura de prisões
e assassinatos interessantes para nossos abutres.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu permaneceria eternamente vendendo cópias
dos desenhos dos cavaleiros do zodíaco
para crianças cegas, anões e ninjas aposentados.
eu estaria parado na frente de um rinoceronte
fumando um fininho californiano encontrado
entre sapatos abandonados e hare krishnas.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu estaria o dia inteiro enfiando álcool e gasolina
nos tanques de combustível dos carros currados
por motoristas sem imaginação, depois do polimento.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu ainda estaria trabalhando na televisão
ligando para delegacias à procura de prisões
e assassinatos interessantes para nossos abutres.
não fosse a escrita, na melhor das hipóteses
eu permaneceria eternamente vendendo cópias
dos desenhos dos cavaleiros do zodíaco
para crianças cegas, anões e ninjas aposentados.
quinta-feira, 22 de janeiro de 2015
terça-feira, 20 de janeiro de 2015
ainda estamos juntos
apesar de você praticar yoga com imigrantes vietnamitas
depois de molhar os pés nas águas do pacífico, enquanto
eu continuo catando moedas velhas nas areias sem fim
de uma praia fracassada lambida pelo atlântico -
tudo isso para entulhar a alma de ferrugem
e encher os bolsos com os avisos dos gansos.
apesar de você encontrar o táxi-chuvoso que te ilumina
e diz que todas las noches terminan en el malecón,
enquanto eu sigo enterrando chaves de fenda no fundo dos olhos
dos peixes abandonados debaixo da vaidade do sol, enquanto
eu permaneço escrevendo poemas para depósitos bancários,
poemas para trocar por lsd fajuto feito com listas telefônicas
e bastante cola branca, enquanto eu fico telefonando
para as alucinações, juntando as vísceras e os vícios
dos pardais devorados pelos banhos de soda cáustica.
apesar de você mergulhar com tubarões na polinésia
e descobrir as potências sexuais e curativas de moquecas
condimentadas com muito cravo, páprica e pimentas negras,
enquanto eu não paro de comer o pão que o diabo traz
de uma padaria tailandesa onde um anão viciado em pôquer
produz receitas tristes embalado por um tango lunático.
apesar de você amanhecer entre os dentes dos mímicos
desempregados da última turma da universidade de pequim,
enquanto eu anoiteço dentro da geladeira, ladeira abaixo,
enquanto eu anoto quase todas as frases que não me dizem
mas que eu escuto, enquanto eu estoco tristeza e feijão
debaixo das unhas - o suficiente para alimentar as canções
das baleias migrantes à procura de águas quentes.
ainda estamos juntos: somos vizinhos da enfermaria nº6.
ainda estamos juntos e jantamos os ossos da alegria e do tédio.
ainda estamos juntos e morreremos juntos e nossas juntas
serão colocadas na mesma caixa de ferro e lançadas ao mar.
apesar de você saber assoviar, enquanto eu sei cuspir mais longe:
ainda estamos juntos e ficaremos bem velhinhos como ronnie & donnie.
depois de molhar os pés nas águas do pacífico, enquanto
eu continuo catando moedas velhas nas areias sem fim
de uma praia fracassada lambida pelo atlântico -
tudo isso para entulhar a alma de ferrugem
e encher os bolsos com os avisos dos gansos.
apesar de você encontrar o táxi-chuvoso que te ilumina
e diz que todas las noches terminan en el malecón,
enquanto eu sigo enterrando chaves de fenda no fundo dos olhos
dos peixes abandonados debaixo da vaidade do sol, enquanto
eu permaneço escrevendo poemas para depósitos bancários,
poemas para trocar por lsd fajuto feito com listas telefônicas
e bastante cola branca, enquanto eu fico telefonando
para as alucinações, juntando as vísceras e os vícios
dos pardais devorados pelos banhos de soda cáustica.
apesar de você mergulhar com tubarões na polinésia
e descobrir as potências sexuais e curativas de moquecas
condimentadas com muito cravo, páprica e pimentas negras,
enquanto eu não paro de comer o pão que o diabo traz
de uma padaria tailandesa onde um anão viciado em pôquer
produz receitas tristes embalado por um tango lunático.
apesar de você amanhecer entre os dentes dos mímicos
desempregados da última turma da universidade de pequim,
enquanto eu anoiteço dentro da geladeira, ladeira abaixo,
enquanto eu anoto quase todas as frases que não me dizem
mas que eu escuto, enquanto eu estoco tristeza e feijão
debaixo das unhas - o suficiente para alimentar as canções
das baleias migrantes à procura de águas quentes.
ainda estamos juntos: somos vizinhos da enfermaria nº6.
ainda estamos juntos e jantamos os ossos da alegria e do tédio.
ainda estamos juntos e morreremos juntos e nossas juntas
serão colocadas na mesma caixa de ferro e lançadas ao mar.
apesar de você saber assoviar, enquanto eu sei cuspir mais longe:
ainda estamos juntos e ficaremos bem velhinhos como ronnie & donnie.
grandelícia
as tristezas não sopram as retinas
cansadas da velha guerra
entre a febre
e o ouro.
cansadas da velha guerra
entre a febre
e o ouro.
à beira do abismo, uma sopa.
há uma cantoria dentro dos ossos,
há uma cantoria dentro dos nossos
dias mais esquisitos e espatifados
e espalhados pelo chão da cozinha.
na foda dos bonobos, na sinceridade
dos cinzeiros cheios de dentes,
nas bicicletas sorridentes e enferrujadas,
nas pilhas velhas, nas ilhas de cimento:
tédio, tesão
e um cheiro de caju impregnado no cu
das nove mil noites de cianureto.
há uma cantoria dentro dos ossos,
há uma cantoria dentro dos nossos
dias mais esquisitos e espatifados
e espalhados pelo chão da cozinha.
na foda dos bonobos, na sinceridade
dos cinzeiros cheios de dentes,
nas bicicletas sorridentes e enferrujadas,
nas pilhas velhas, nas ilhas de cimento:
tédio, tesão
e um cheiro de caju impregnado no cu
das nove mil noites de cianureto.
sábado, 3 de janeiro de 2015
arte poética
incendiar noites e dias, a carne do mundo
lamber perambulando entre onças e pedras.
sorrir na companhia dos mendigos.
sujar as retinas, as botas, as beatas
foder. ao redor do umbigo,
cuspir.
amar a água, a égua, a águia e
comer os caminhos abertos da invisibilidade.
repartir as vísceras, próprias e alheias, entre chacais,
tanques de combustível e soluços.
voar no céu da boca, vadiar debaixo dos monturos.
perder os dentes, os dedos, poder povoar a solidão.
provocar brigas, dançar forró com garis nas madrugadas,
digerir didgeridoos, apaziguar as mortes azuis.
lamber perambulando entre onças e pedras.
sorrir na companhia dos mendigos.
sujar as retinas, as botas, as beatas
foder. ao redor do umbigo,
cuspir.
amar a água, a égua, a águia e
comer os caminhos abertos da invisibilidade.
repartir as vísceras, próprias e alheias, entre chacais,
tanques de combustível e soluços.
voar no céu da boca, vadiar debaixo dos monturos.
perder os dentes, os dedos, poder povoar a solidão.
provocar brigas, dançar forró com garis nas madrugadas,
digerir didgeridoos, apaziguar as mortes azuis.
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